Mensagem viralizou em grupos de whatsapp e motivou manifestações de ódio
entre médicos
O Globo - Uma médica do Hospital
Sírio-Libanês compartilhou com terceiros informações sigilosas do diagnóstico
da ex-primeira-dama Marisa Letícia, horas depois de sua internação, há dez
dias. Médica reumatologista, Gabriela Munhoz, de 31 anos, enviou mensagens a um
grupo de whatsapp de antigos colegas de faculdade, confirmando que dona Marisa
estava no pronto-socorro com diagnóstico de Acidente Vascular Cerebral (AVC)
hemorrágico de nível 4 na escala Fisher — considerado um dos mais graves —
prestes a ser levada para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Na noite desta
quarta-feira, o hospital informou que Gabriela foi demitida por causa do
compartilhamento de informações sigilosas, embora não tenha informado a data em
que isso aconteceu.
De acordo com o Código de Ética
Médica, profissionais de saúde não podem permitir o acesso de terceiros a
prontuários de pacientes. A mensagem foi compartilhada no grupo intitulado “MED
IX”, numa referência à turma de formandos em Medicina de 2009 na Universidade
Federal do Mato Grosso do Sul, e se espalhou em outros grupos de whatsapp. O
boletim médico divulgado horas depois pelo hospital faz referência à hemorragia
cerebral por ruptura de um aneurisma, mas não dava detalhes técnicos a respeito
da gravidade do diagnóstico.
Desde
o dia 24 dona Marisa está em tratamento na UTI. Nesta quarta-feira houve uma
piora em seu estado de saúde e exames apontaram que ela não tem mais fluxo cerebral. A família autorizou
a doação de seus órgãos.
No dia de sua internação, um
médico que atua fora do Sírio Libanês foi o primeiro a enviar informações sobre
o diagnóstico de dona Marisa no grupo “MED IX”. Pedro Paulo de Souza Filho
postou imagens de uma tomografia atribuída a dona Marisa Letícia, acompanhada
de detalhes que foram confirmados, em seguida, por Gabriela.
Os dados foram compartilhados por
Pedro Paulo a partir de um outro grupo de médicos, intitulado “PS Engenho 3”, e
atribuídos ao cardiologista Ademar Poltronieri Filho.
A colegas, Gabriela alegou ter
confirmado informações já divulgadas na mídia, em grupo restrito de médicos de
sua confiança. Ela lamentou que tenham sido compartilhadas com outros grupos e
disse não ter tido contato pessoal com o prontuário. Localizada pelo GLOBO, ela
não quis se manifestar.
Em nota, a direção do
Sírio-Libanês informou ter “uma política rígida relacionada à privacidade de
pacientes” e repudiou a quebra do sigilo de pacientes por profissionais de
saúde.
“Por
não permitir esse tipo de atitude entre seus colaboradores, a instituição tomou
as medidas disciplinares cabíveis em relação à médica, assim que teve
conhecimento da troca de mensagens”, escreveu a assessoria da instituição,
depois de ser procurada pelo jornal.
MENSAGENS DE
ÓDIO
Em postagem publicada no mesmo
grupo, um colega de Gabriela, o médico residente em urologia Michael Hennich,
brincou quando ela disse que dona Marisa não tinha sido levada, ainda, para a
UTI: “Ainda bem!”. Gabriela respondeu com risadas.
Com registro de residente no
Hospital Evangélico de Curitiba, no Paraná, Michael disse ao GLOBO que não
ironizou a gravidade da saúde de dona Marisa, mas se referiu a um erro do corretor
ortográfico do telefone da colega, que trocou UTI por URO:
- Eu disse ainda bem que ela não
foi para a URO (urologia). Motivo: teria ido por engano para a especialidade
errada. Não falei UTI — afirmou o médico, que preferiu não comentar a quebra de
sigilo do diagnóstico.
Outro médico do grupo, o
neurocirurgião Richam Faissal Ellakkis, também comentou o quadro de dona
Marisa:
“Esses fdp vão embolizar ainda
por cima”, escreveu, em referência ao procedimento de provocar o fechamento de
um vaso sanguíneo para diminuir o fluxo de sangue em determinado local. “Tem
que romper no procedimento. Daí já abre pupila. E o capeta abraça ela”,
escreveu Ellakkis, que presta serviços no hospital da Unimed São Roque, no
interior de São Paulo, e em outras unidades de saúde da capital paulista.
O GLOBO deixou recados em
telefones, e-mails e local de trabalho de Ellakkis, Poltronieri e Pedro Paulo,
mas eles não retornaram os contatos.
O Conselho Regional de Medicina
do Estado de São Paulo (Cremesp) já investiga o vazamento de imagem de um exame
de tomografia da mesma paciente, realizado logo após o AVC, divulgado em redes
sociais nos últimos dias.
Em nota divulgada na última
segunda-feira, o conselho informou que “o compromisso e a ética ante a saúde de
cada um dos cidadãos colocam-se, sem distinções de qualquer natureza, sempre
acima de interesses que não sejam fiéis à dignidade inviolável da pessoa doente
junto aos seus entes queridos”.
O Hospital Sírio-Libanês
argumenta que a tomografia não foi realizada em sua unidade, por isso não teria
partido do hospital. Na ocasião, divulgou nota afirmando que “zela pela
privacidade de seus pacientes”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário